A Justiça do Trabalho reconheceu a prática de assédio moral por parte da Petrobrás contra uma trabalhadora da Refinaria Gabriel Passos (Regap) e condenou a empresa a indenizar a vítima. A sentença foi publicada em 1ª instância na semana passada.
Segundo a vítima, o caso teve início em 2012, quando mais de metade dos funcionários do setor protocolou uma denúncia na Ouvidoria da Petrobrás sobre casos de assédio moral envolvendo um supervisor da mesma área. Os abusos foram, inclusive, noticiados pelo Sindipetro-MG.
Ainda conforme a trabalhadora, esse fato desencadeou perseguições a alguns autores da denúncia, visto que o supervisor passou a utilizar de sua autoridade para agravar a prática de assédio: ameaçando, chantageando e prejudicando os funcionários em progressões de níveis automáticas.
Nesse mesmo período, surgiram boatos de que a trabalhadora e seu noivo – também funcionário da Regap e seu colega de grupo – “estariam namorando no setor”. A empresa então, transferiu a vítima de grupo de turno, legitimando assim o boato.
Inconformada, a petroleira se reuniu inúmeras vezes com a chefia, na tentativa de reverter a punição, mas não obteve sucesso. Em uma dessas ocasiões, chegou a ouvir do seu superior que “você tem que aceitar esses boatos… bonita… entendeu? Bonita… chama a atenção, entendeu?…”.
Decidiu então entrar com uma ação de assédio moral contra a empresa e, após quatro anos, a sentença foi finalmente proferida, dando ganho de causa à trabalhadora. O juiz Daniel Gomide, da 3ª Vara do Trabalho de Betim, entendeu que a mudança de grupo apenas reforçou os boatos sobre a trabalhadora ao invés de combatê-los e determinou “a nulidade de qualquer transferência da autora para outro grupo/setor de sua atual lotação (G2), exceto em caso de necessidade técnica, devidamente comprovada e/ou requerimento / concordância expressa da autora”.
“Nesse ponto, considero que a alteração dos grupos de trabalho após a efetivação desse boato, foi na contramão do recomendável, pois se surge uma suspeita (infundada), a reclamada deveria manter os envolvidos nas mesmas condições, exatamente para demonstrar a inexistência de motivo ou razão, de forma a não alimentar a desconfiança alheia – onde há fumaça há fogo, o que em ambiente de trabalho, não corresponde à realidade, como dito anteriormente”, emendou.
Sobre as situações absurdas vividas pela trabalhadora, o juiz ainda afirmou que “mulheres não são objetos ou coisas, assim como homens não podem ser tratados como animais, incapazes de respeitar a condição de outra pessoa ou o fato de ser mulher, dmv. A utilização das expressões como as usadas na conversa transcrita nos autos dá a entender que não se trata de um local de trabalho, mas de uma selva, na qual os instintos são sobrepostos à racionalidade. Não é o fato de estar trabalhando um grupo de homens lado a lado a uma mulher que isto se tornará ambiente propício à lascívia ou a comentários pejorativos”.
Na avaliação do Sindipetro/MG, essa decisão é muito importante pois mostra que os trabalhadores vítimas de assédio devem buscar seus direitos e denunciar casos de perseguição e retaliação. O Sindicato está a disposição para acolher quaisquer denúncias nesse âmbito. “O assédio não é aceitável e é direito de o trabalhador ter um ambiente de trabalho saudável”, afirma o diretor Alexandre Finamori.
Direitos das petroleiras
Nas últimas décadas, houve um crescimento significativo da participação das mulheres no mercado de trabalho. Porém, esse crescimento não veio acompanhado de reconhecimento, já que a remuneração das mulheres ainda é 30% menor que a dos homens. O que se percebe é que essa realidade não está separada de um contexto de precarização do trabalho. Não é novidade que, após o golpe, vimos a escalada de violações dos direitos dos trabalhadores, a começar pela Reforma Trabalhista (Lei 13.467/17) que, dentre outros tantos abusos, passou a permitir o trabalho de grávidas e lactantes em condições insalubres.
No caso do Sistema Petrobrás, a participação da mulher tem sido crescente e significativa, porém as diferenças entre homens e mulheres estão fortemente arraigadas na empresa. No I Encontro de Mulheres Petroleiras de Minas Gerais, realizado em março de 2018 no Sindipetro/MG, foram relatados muitos casos de assédio e de preconceito contra as trabalhadoras. Esse tema também objeto de discussão no 6° Encontro Nacional de Mulheres Petroleiras, realizado em abril de 2018, em Natal (RN), e na VII Plenária Nacional da FUP, que ocorreu em agosto, no Rio de Janeiro.
Nesse contexto, o departamento jurídico do Sindipetro/MG, por meio da coordenadora Denise Ferreira Marcondes e das advogadas Ana Luíza Fernandes e Priscilla Brandão, percebeu a necessidade de criar um espaço de diálogo, onde as petroleiras se sintam à vontade para expor suas demandas – dentro e fora do ambiente de trabalho. A proposta não é segregar ainda mais as mulheres, mas oferecer um atendimento jurídico amplo, voltado para especificidades das demandas femininas.
“Nossa ideia é que as mulheres se sintam mais à vontade para tratar de questões que enfrentam no seu dia-a-dia de trabalho e também fora dele. Hoje, mais do que nunca, o mundo demanda o olhar para o outro. Assim, entidades como os sindicatos precisam abrir suas portas e seus olhos para as pautas femininas. Se quisermos representar a categoria de forma igualitária, será preciso ouvir e incluir”, afirmou a advogada Ana Luíza Fernandes.
Na Petrobrás, muitos direitos já foram conquistados, em especial por meio do trabalho desenvolvido pelo Coletivo de Mulheres Petroleiras da FUP. Contudo, é preciso estar em constante vigilância, de maneira a evitar situações graves, como o assédio moral sofrido pela petroleira.
De acordo com a advogada Denise Ferreira Marcondes, “como a Petrobrás possui o Selo Pró-Equidade de Gênero e Raça, é importante exigir o cumprimento de todas as ações e medidas previstas no Programa Pró-Equidade de Gênero e Raça. O primeiro passo é a criação desse espaço de defesa da mulher petroleira dentro do Sindipetro/MG”.
Com informações do Sindipetro-MG