No primeiro semestre de 2021, o Sindipetro/ES deixou de receber o valor de R$ 250 mil das contribuições dos associados. A Petrobrás recolheu essa quantia, atendendo a decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) referente à multa imposta contra o movimento de greve realizado em 2018. Infelizmente, esses tipos de retaliação e resistência jurídicas não são novidades para os Sindicatos. E também não devem ser motivo para desistir da luta!
Afinal, o direito de greve está garantido na Constituição Brasileira, como explica o advogado Edwar Barbosa Felix, da Felix Porto & Advogados Associados. “A nossa Constituição assegura o direito dos trabalhadores a deflagrarem greve. E ela ainda diz que, além de existir o direito de greve, a deliberação sobre que tipo de interesse é possível se defender na greve cabe exclusivamente aos trabalhadores. Ou seja, é o trabalhador quem decide o motivo de deflagrar a greve, não há restrições”, reforça Edwar Felix.
Se essa é a defesa da Constituição, por que os petroleiros e tantas outras categorias de trabalhadores brasileiros vêm enfrentando constantes retaliações por parte do setor jurídico, em especial do TST?
Segundo Edwar Felix, há um posicionamento por parte do TST que tende a limitar quais seriam os interesses possíveis a serem defendidos numa greve. No entendimento do Tribunal somente seriam defensáveis interesses ligados às condições de trabalho, tanto no aspecto de segurança e ambiente da empresa, quanto na parte relacionada à remuneração. “Mas essa posição ignora a nossa Constituição, que dá total autonomia e independência aos trabalhadores para escolher o motivo de uma greve”, aponta.
O que se entende, com essa postura, é que o TST não vai abrir qualquer possibilidade para greves que tenham outros motivos, que não salariais ou de condições físicas de trabalho, a exemplo das que apontem questionamentos políticos e sociais.
“É importante reforçar, aqui, que o movimento de greve é, por si só, um ato político e social. Independente do seu motivo. Sendo assim, ao defender uma manifestação legítima, que tenha como interesse questionar as decisões de políticas liberais que levam a privatização de uma empresa estatal, por exemplo, os trabalhadores estão realizando um ato de motivação política, mas também estão defendendo o interesse social que a empresa proporciona. Ou seja, uma decisão de política liberal destinada a privatizar uma empresa estatal pode e deve ser contestada por uma posição política social, de um movimento grevista contrário à privatização, pois afinal também se está defendendo o direito ao emprego”, defende Edwar Felix.
Dessa forma, compreende-se que independente do governo ser liberal e conservador, a greve também é instrumento, assegurado pela Constituição, para que ideias progressistas e sociais sejam também pautados pelo movimento. Afinal, sendo a Petrobrás uma empresa estatal – que também tem interesses privados, principalmente de lucro – esta deve atuar pelo interesse público, contribuindo com a sociedade. “Em um movimento de greve que defenda o interesse social e público, os petroleiros podem não aceitar a privatização e ir ao debate, ao enfrentamento, por meio da greve”, reforça Edwar Felix. Dessa forma, o real motivo dos trabalhadores será a visão pública, com interesse na coletividade e defendendo politicamente que a empresa se mantenha estatal, cumprindo com suas funções enquanto política pública nacional.
Além desse ponto, os petroleiros vêm enfrentando, nos últimos anos, outra resistência do judiciário trabalhista. Somado ao fato do TST não vir aceitando uma greve que tenha uma motivação política e social, ignorando a independência e a autonomia dadas aos grevistas pela Constituição, a jurisprudência trabalhista ainda vem restringindo o alcance das greves, mesmo quando essas estão focadas nas condições de trabalho.
Isso acontece porque dentro da lei de greve estão definidas quais são as atividades essenciais, e a dos petroleiros é uma delas. Isso traz por consequência questões formais, como o tempo prévio para comunicar o início da greve; mas, especialmente, limita no plano material a sua extensão, considerando o período total de paralisação das atividades; além de interferir na quantidade de trabalhadores paralisados, já que o serviço essencial não pode ser interrompido por completo. “Ou seja, ao decretar a greve, o judiciário vai impor de imediato um quantitativo mínimo de pessoal que deve seguir trabalhando, e dependendo do percentual estabelecido o efeito da greve pode ser anulado”, comenta Edwar Felix.
O que fazer contra essas decisões jurídicas? Como os trabalhadores podem agir contra um judiciário que retalia as manifestações grevistas, garantidas pela Constituição?
A resposta é curta e direta: não recuar! “A única medida é permanecer nesse embate social. Não há outra postura”, enfatiza Edwar Felix. Segundo o advogado, permanecer no embate é a melhor alternativa. “O debate social, inclusive no meio jurídico, se faz por meio de enfrentamento. Não há outra forma de entendermos nossa construção social. É preciso seguir com posicionamento, postura, debate e articulação. Esse é o caminho”, defende.
Essa necessidade de se manter resiliente no movimento grevista é por compreender que os interesses defendidos pelos petroleiros, em especial contra as privatizações, são interesses maiores, que atendem à sociedade. “Não é porque fomos penalizados com uma multa que vamos deixar de nos mobilizar para seguir com o enfrentamento. O debate social promove novas soluções, e ficar inerte não ajuda em nada. Ao manter o embate você tenta seguir com essa mudança social, apontando que esse entrave jurídico é inconstitucional e não cabe ao movimento”, reforça Edwar Felix.
Até porque, segundo ele, o relacionamento com diversos atores envolvidos no seguimento, dentre eles o Ministério Público do Trabalho (MPT), melhorou nos últimos anos, tanto com as denúncias apresentadas ao órgão quanto na colaboração em ações movidas pela própria instituição. “A postura do judiciário de ainda fechar as portas para as greves é equivocada. Só que a cada porta fechada, novos debates são construídos em torno dessa mudança, e isso é bom”, diz.
Edwar Felix ainda aponta outra questão fundamental para que a categoria petroleira siga no enfrentamento e na defesa dos movimentos grevistas de interesse social e político: sua referência histórica na luta dos trabalhadores. “A categoria petroleira é composta por uma série de profissionais qualificados, especializados e com ótima consciência social. São pessoas com alta capacidade de entendimento e articulação, de mobilização e, também, com boa formação política. Se o petroleiro desiste de lutar todos os trabalhadores perdem, de todas as categorias. Não está na hora de se omitir, muito menos de desistir”, defende ele.