A primeira mesa, do terceiro e último dia do 30º Congresso Estadual dos Petroleiros do Espírito Santo – CONGREPES trouxe, para o debate, o assunto: “Energia para o futuro: o fim do petróleo ou o fim da Petrobras?”. A atividade começou por volta das 10h30. O evento segue durante todo este sábado (10/07), com transmissão pelo YouTube do Sindipetro-ES.
Na coordenação da mesa, o diretor da Secretaria de Comunicação, Etory Feller. Ele comandou o debate, que contou com a presença de Francismar Cunha, doutorando em Geografia pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes); Alexandre Finamori, diretor do Sindipetro-MG; e Henrique Jager, diretor técnico do INEEP.
Assista à Mesa “Energia para o futuro: o fim do petróleo ou o fim da Petrobras?” >> (clique aqui). Ainda neste link, vai estar disponível a mesa que aconteceu na sequência, também na manhã deste sábado (10), com o tema: “Saúde e segurança do trabalhador em tempos de pandemia”.
Desmonte
O geógrafo Francismar Cunha, doutorando em Geografia pela Ufes, recuperou em sua fala alguns pontos importantes sobre a as fases da indústria do petróleo em nosso país, alinhando uma contextualização histórica entre as alterações nas leis brasileiras e a atuação da Petrobras, em especial nas áreas de exploração, apontando, por exemplo, o quanto o Pré-Sal representou uma chegada mais forte das empresas internacionais no Brasil.
“É curioso ter uma inserção das multinacionais dentro do Pré-Sal, com alteração dos regimes de partilha, e a chegada delas no entorno dessas áreas”, pontuou Cunha. Para ele, esse movimento apontava um caminho do interesse internacional na privatização da Petrobras, principalmente depois dos últimos leilões promovidos pelo Governo para as novas áreas de exploração de petróleo, em Pré-Sal, no Brasil.
Além desse movimento de redução da participação nacional da Petrobrás, ele ainda apontou o desinteresse da empresa nos investimentos internacionais, o que ampliou o processo de privatização. Durante sua fala, Cunha ainda pontuou cada uma das unidades que já foram vendidas ou colocadas a venda, como gasodutos e refinarias, assim como os campos de exploração. “São seguimentos extremamente estratégicos, e que já estão sendo desfeitos pela Petrobrás”, salientou.
Em sua apresentação, o doutorando em Geografria pela Ufes apontou todas as áreas que a empresa anunciou para venda ou já vendeu, no país, nos últimos anos, que vem se desfazendo de Unidades em estados do Norte, Nordeste, Sul e Sudeste do país, incluindo o Espírito Santo, a exemplo do Polo Norte, que está atualmente à venda. “A Petrobrás ainda não saiu da produção onshore do Espírito Santo, mas colocou praticamente todos seus ativos à venda. Acontecendo quase o mesmo na operação offshore da empresa”, reforçou Cunha.
E, segundo ele, a Petrobrás, além de estar vendendo vários de seus ativos, vem reduzindo, desde 2013, os investimentos da empresa. E essas decisões também podem ser vistas pela redução percentual da participação da Petrobras na produção, acontecendo o mesmo no número de trabalhadores. “A empresa vem reduzindo o número de trabalhadores, desde 2013. E não só de próprios, mas também de terceirizados. O que era mais de 350 mil, em 2019, chegou a menos de 100 mil.
Se somar toda a cadeia de petróleo, somente no Espírito Santo, eram aproximadamente 45 mil trabalhadores, em 2013; sendo que em 2019 esse número chegou a 5 mil. Mesmo com tantas essas mudanças, ele acredita que ainda não seja o fim da empresa. “A Petrobras é um patrimônio e um bem do país, que vai continuar sendo, e é defendida por todos que querem o bem da nação e da empresa. Quando a Petrobrás vai bem, o Brasil vai bem. Ela vai passar por mudanças, está sofrendo, mas vai sobreviver e dar a volta por cima”, defendeu Francismar Cunha.
Petróleo e energia
Em seguida, o diretor técnico do INEEP, Henrique Jager, trouxe informações sobre os usos de energias, renováveis e não-renováveis, no Brasil e no mundo. A partir de uma breve contextualização histórica do consumo nacional e mundial dessas energias, suas análises apresentaram qual seria o percurso natural para a indústria do petróleo, mundialmente.
Como apontou Jager, para que haja uma mudança de base energética para uma produção de energia renovável serão necessárias, ainda, décadas para efetivar essa transformação. “Fala-se muito da renovação energética, mas o mundo tem uma dependência muito grande das energias não-renovavéis do petróleo, e você não muda isso de uma hora para outra”, considerou.
Segundo ele, entre a primeira revolução industrial e meados do século passado, nos anos 50, o combustível mais consumido no mundo era o carvão. “O petróleo se torna hegemônico a partir de 1950. E isso mostra, por exemplo, o tempo que as energias renováveis vão levar para se tornar hegemônica. Hoje em dia, elas respondem cerca de 7%, e somente lá em 2040 vão chegar próximo de 20%. É uma transição de longuíssimo prazo”, ressaltou Jager.
Segundo o último balanço energético nacional do MPE, com dados de 2020, 52% da energia total produzida no país é não renovável, contra 48% de renovável. E com destaque para o crescimento das produções de energias eólicas e fotovoltaicas. Porém, como alerta o diretor técnico do INEEP, essas mudanças de produção energética precisam considerar o consumo global de energia.
Hoje, quem mais consome energia são os países com maior desenvolvimento. Para o futuro, se consideramos a redução da desigualdade e da miséria em países como o Brasil, a China e a Índia, a tendência é de termos um aumento mundial nesse consumo. “A tendência, no médio e longo prazo, é que esses países sigam aumentando seu consumo de energia e, consequentemente, será necessário aumentar a produção de energia”, ressaltou Jager.
Consumo
China e Índia, por exemplo, ainda estão na fase do carvão. “Mais de 50% da matriz energética, do que eles consomem lá, é produzida a partir do carvão. Eles nem chegaram na fase do petróleo. E usar carvão polui muito mais que o petróleo. E ao mesmo tempo que eles devem fazer o esforço de crescer as forças de energias renováveis, como fotovoltaicas na Índia, eles também crescerão o consumo do petróleo como energia”, avaliou o diretor técnico do INEEP.
Dessa forma, como aponta Jager, por mais que se aumente a produção de energia renovável, também haverá o crescimento do consumo. “Então, por mais que se aumente a participação dessas energias, você não vai reduzir o consumo de petróleo e de gás natural. Pelo contrário, terá aumento”, frisa ele.
O diretor técnico do INEEP ainda ressaltou a importância de se manter e ampliar os investimentos em energias renováveis. Mas alerta que, assim como a hidroeletricidade não é ilimitada, visto que quando não se tem água, não tem geração de energia, o mesmo pode ocorrer com a energia gerada pelo sol ou pelo vento. “Isso porque a produção varia muito. Teria que ter parques eólicos e fotovoltaicos, muito grandes e distribuídos nacionalmente. Mas quando não tiver sol, nem vento, você tira energia de algum lugar. Antes era a água, mas agora, com a escassez, a termelétrica é a solução, mesmo sendo mais cara”, pontuou Jager.
Lembrando que essa equação não é nada simples, ele afirmou, durante sua fala, que ainda serão necessárias décadas de transformação para que as energias renováveis sejam a principal fonte, no mundo. E, mesmo assim, o petróleo seguirá sendo fonte de energia por século. Principalmente porque também é fonte de matéria prima de mais de 4 mil produtos. “Esse é o futuro da indústria de petróleo, deixando de ser a principal fonte de energia no mundo, mesmo sendo de fonte de energia por séculos e fonte de matéria prima”, finalizou.
Biodiesel
Dando sequência ao debate, o diretor do Sindipetro-MG, Alexandre Finamori, lembrou a todos que, como informou Jager, o petróleo passou o carvão, como energia mais consumida no mundo, somente nos 50. “Mas o carvão ainda corresponde a mais de 20% do consumo mundial, de energia”, salientou ele. Reforçando que, ao mesmo tempo que as matrizes de energia estão crescendo, o consumo de energia também está cresce.
O que faz o diretor ponderar as questões sociais que envolvem o consumo de energia, a exemplo do que pode provocar o aumento do preço do gás de cozinha. “As famílias brasileiras estão deixando de usar o gás na produção de alimento. Passam a usar lenha ou carvão, por exemplo. Então, ao mesmo tempo que o nosso país precisa mudar a sua produção energética, o Brasil também precisa garantir que todo brasileiro tenha sua dignidade respeitada, para ter condições de consumir essa energia”, disse Finamori.
Ele aproveitou o debate para resgatar o Programa Nacional de Desenvolvimento e Uso de Biodiesel, iniciado no governo de Lula (PT), em 2004. A partir desse projeto, houve o incentivo às empresas privadas para desenvolver a produção do biodiesel no Brasil. “Mas o capital privado não está preocupado com o projeto a longo prazo do país, está preocupado com o lucro imediato. Desde 2004, nenhuma indústria de biodiesel foi construída pelo capital privado nas áreas de incentivo oferecido pelo país. Apenas três usinas foram construídas no semi-árido, e todas pela Petrobrás”, lembrou o diretor do Sindipetro-MG.
O que faz reforçar, segundo ele, a importância da sustentabilidade ser tanto no ponto de vista ambiental quanto no social. E o biodiesel, como afirma Finamori, é sustentável porque usa a produção da agricultura familiar para a produção dessa energia renovável. Porém, assim como aconteceu com o Pré-Sal, somente após os investimentos estatais romperem as barreiras da produção do biodiesel e torná-lo lucrativo que o setor privado passou a manifestar interesse nesse negócio.
“Mas a Petrobras biocombustível é muito maior que o biodiesel. E exatamente por isso não dá para deixar na mão do capital privado o nosso caminho de transição. A transição energética é um projeto de país, de Estado. Os grandes países, todos eles, têm no seu planejamento a transenergia. Mas o Brasil parece estar de fora”, pontuou Finamori.
PBio
Por aqui, o que vem acontecendo é a venda da PBio, por exemplo, com os trabalhadores sendo vendidos como equipamentos, sendo transferidos pela concessão. “Só em Minas Gerais, as usinas de Montes Claros, chegaram a consumir a produção de nove mil famílias de agricultores. E todos podem perder sua renda com a venda dessas unidades. O Candeias (CE) chegou a consumir produtos de mais de 20 mil famílias. Olha o impacto socioeconômico que essa privatização vai gerar”, enfatizou o diretor do Sindipetro-MG.
Como ele mesmo citou, essa venda é tão absurda que “até a Miriam Leitão criticou a venda da Petrobras Biocombustível”. O que, para Finamori, é uma venda ilegal. “O terreno dessas usinas não é de direito da Petrobras. Ela não pode vender porque as áreas foram cedidas pelas prefeituras, e isso está em discussão”, explicou.
Por fim, o palestrante trouxe como reflexão o que estaria por trás no interesse da venda da PBio. “Quem ganha um dólar numa vacina, ganha quanto na venda da RLAM (Refinaria Landulpho Alves), que está sendo vendida pela metade do preço?”, questiona o diretor do Sindipetro-MG.
Reforçando que esses interesses privados, do lucro acima de tudo, ferem diretamente o projeto inicial de construção da Estatal. “A Petrobras detém, dentro dela, um projeto nacional. Ela não é uma empresa de mercado. Ela precisa dar lucro, sim, como qualquer empresa, mas o foco principal dela é o projeto social e de país, que traz na sua concepção. Ela tem a obrigação de pegar o dinheiro do petróleo e usá-lo para longo prazo, inclusive de transição energética”, ressaltou Finamori.
E concluiu: “Se a Petrobras for privatizada, e todo o petróleo servir apenas para trazer lucro aos acionistas, nós teremos no Brasil um aumento dos problemas sociais, da contaminação ambiental e do lucro estrangeiro. Olha o que a mineração fez em Minas Gerais e no Espírito Santo? A privatização da Vale só deixou crime ambiental”, frisou. Para ele, o que devemos promover é o discurso de qual Petrobras o país quer, e não o que o acionista quer.
Sorteio
Ao fim de todas as falas, depois das rodadas de perguntas e respostas, foram realizados três sorteios, a partir da lista de participação, com o link sendo disponibilizado durante a realização do debate no chat do YouTube. Os vencedores foram: Filipe Franco, de um kit de beleza e cuidados pessoais; Elizabeth Santos Nascimento, de um Smart Watch; e Karina Campos de Souza Bastos Hubner. O evento teve participação média superior a 30 pessoas assistindo.
Último dia
O 30º CONGREPES termina neste sábado, dia 10 de julho. Na tarde deste sábado, os trabalhos serão retomados a partir das 14 horas, com a mesa “O sindicalismo moderno e a urgência de ressignificar o trabalho”. Confira: https://www.youtube.com/watch?v=fHRZrtgC_OE.
A quinta e última mesa do 30º CONGREPES será seguida da finalização e leitura da carta do Congresso. A partir das 16 horas, o evento partirá para a eleição da delegação que irá representar o Espírito Santo na IX PLENAFUP. O evento será encerrado às 16h30.