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‘A criança que morre de Covid é a pobre e negra’, diz pesquisadora

Desigualdade se reflete na morte de mais de 3 mil crianças em decorrência da covid; Brasil é 2º país com mais mortes no mundo

“A criança que está morrendo de covid-19 é a pobre, negra, que mora em favelas ou cidades menores. De famílias que são obrigadas a continuar trabalhando”. A afirmação é da epidemiologista Fatima Marinho, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e da Vital Strategies, organização de saúde que realizou um levantamento sobre crianças e covid-19.

A pesquisa mostrou que 57% das crianças mortas pela covid no Brasil, desde o início da pandema, em março do ano passado, até abril deste ano, eram negras, 21,5%, brancas, 16% não tiveram a raça indicada, 4,4%, indígenas e 0,9 %, amarelas (de origem asiática).

“Essa vulnerabilidade, que não é novidade no Brasil, piorou com a pandemia, que fez com que a situação social e econômica dessas pessoas piorasse e, consequentemente, piorou a saúde”, diz.

“Elas vivem em condições precárias, especialmente com a perda de emprego e renda, muitos perderam a casa onde moravam e foram viver com parentes. Aglomera mais e aumenta a situação de vulnerabilidade dentro de casa”, acrescenta.

Desde o surgimento do novo coronavírus, uma situação foi bem definida por médicos e pesquisadores: as crianças apresentam menos riscos de pegar covid-19 da forma grave. Mas, chances mais baixas não significa risco zero. O Brasil ocupa o indigesto ranking de segundo país no mundo com mais óbitos de crianças na pandemia. O país fica atrás apenas do vizinho Peru.

De acordo com o levantamento, 3.198 brasileiros, até os 14 anos, morreram devido a doença causada pelo SARS-CoV-2.

O estudo chegou a essa conclusão por meio da comparação do número de mortos por SRAG (síndrome aguda grave não especificada) em 2019 com o período da pandemia. As informações foram tiradas do Sivep-Gripe (Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe), do Ministério da Saúde.

Para a epidemiologista, a cultura de que criança não fica doente grave faz com que a covid só seja tratada quando está em uma fase mais complicada.

“Dentro da saúde, nós criamos a cultura de que a criança não fica grave. Mas temos de prestar atenção, porque o risco não é zero. Estamos observando que os casos graves que vão ao óbito não foram feitos diagnósticos rápidos. A criança já chega numa situação limite e a morte é uma consequência de alta probabilidade”, explica a médica.

Fatima alerta também que a realidade da pandemia mudou e seguirá evoluindo. “O cenário é outro, a epidemia está rejuvenescendo. As crianças vão ser cada vez mais atingidas, conforme temos mais adultos vacinados; 80 mil crianças abaixo de 10 anos já foram internadas. É grave. O número de mortes já é alto. Não pode aumentar mais”, ressalta ela.

Quais sintomas devem ser observados em crianças?

Uma das formas de evitar que esses números sigam em crescimento é observar melhor os sinais que são dados pelas crianças. Os sintomas mais tradicionais da covid-19, como perda de olfato, paladar e dificuldade para respirar, não são os mais comuns na faixa etária até os 14 anos.

Fatima salienta que fadiga e dores abdominais, seguidas de diarreias devem ligar o alerta. “As crianças não têm os sintomas clássicos da covid de falta de ar. Os sinais são febre, fadiga, tosse seca, não parece que é respiratório, tem dor abdominal e diarreia. Apresentou essas características tem que pensar em covid. Especialmente se a criança estiver muito cansada”, orienta a médica.

Para o infectologista Renato Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria, o número de mortes de crianças serem maiores que em outros lugares era esperado diante da realidade da covid no Brasil.

“O Brasil tem uma mortalidade infantil alta em todas as doenças, somado aos muitos casos de covid no Brasil, logo há mais mortes aqui do que nos outros lugares também. Vivemos o reflexo do sistema de a saúde como um todo. Infelizmente não nos surpreende”, afirma o pediatra. A taxa de mortalidade infantil no país é de 12,4%, segundo dados do IBGE de 2019.  

Mesmo diante de um quadro social complicado e a pandemia ainda pulsante no Brasil, os óbitos em crianças são evitáveis, se os alertas foram observados e respeitados por pais e profissionais de saúde.

“Precisamos ter aprendido a lição e dá para evitar. Com intervenções a tempo, dá para evitar. Nada como um organismo jovem para reagir. As crianças têm muita regeneração celular, então tem muita capacidade de curar sim, mas a intervenção tem de vir no tempo certo”, finaliza Fatima Marinho.

Notícias R7

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