O Ministério Público do Trabalho emitiu, na última segunda feira, dia 05 de outubro, uma nota técnica com 17 recomendações que as empresas devem seguir ao colocarem os trabalhadores home office. Esse tipo de ocupação, que não era muito utilizado pelas empresas, se tornou uma opção desde o começo da pandemia de Covid-19, em março deste ano, como forma de evitar o contágio pelo novo coronavírus, seguindo medida sanitária recomendada pelo Ministério da Saúde, o distanciamento social.
Por ser em um país marcado pelas desigualdades, nem todos os brasileiros e brasileiras possuem condição de trabalhar em casa por diferentes fatores como dificuldade no acesso à internet, pouca familiaridade com a tecnologia, estrutura da casa, espaços adequados para a realização desse tipo de serviço, dentre outros, o que pode acabar se tornando em uma justificativa para precarização das condições de trabalho. A nota do MPT vem para assegurar aos trabalhadores o direito à privacidade, o devido descanso, saúde física, o direito à desconexão, etiqueta digital para evitar bullying contra os trabalhadores, qualquer tipo de intimidação sistêmica dentre outros.
Em relação a nota do órgão, o advogado do SindipetroES, Edward Félix, destaca que a necessidade do direito ao descanso seja assegurado em todos os regimes de trabalho, em especial, o home office: “Assim, no teletrabalho o empregado tem sensivelmente agredido o seu direito ao descanso, pois a vida privada do trabalhador se perde no fato de sua residência se transformar em local de trabalho, inclusive com flagrante prejuízo do convívio familiar. Ademais, haverá sério debate a respeito da quantificação da jornada de trabalho. Como provar o trabalho exercido além da jornada contratual?”, questiona o advogado.
Entre as 17 regras que as empresas devem seguir para garantir o trabalho remoto, estão:
- RESPEITAR a ética digital no relacionamento com os trabalhadores e trabalhadoras, preservando seu espaço de autonomia para realização de escolhas em relação a sua privacidade e segurança pessoal e familiar, bem como em relação à obtenção, armazenamento e compartilhamento de dados fornecidos pelos empregados e empregadas,
- REGULAR a prestação de serviços em regime de teletrabalho, mesmo no período de medidas de contenção da pandemia da COVID-19, por meio de contrato de trabalho aditivo por escrito, tratando de forma específica sobre a duração do contrato, a responsabilidade e a infraestrutura para o trabalho remoto, bem como o reembolso de despesas relacionadas ao trabalho realizadas pelo empregado, nos termos da legislação trabalhista, da legislação aplicável à administração pública e das limitações, procedimentos e determinações dos Órgãos de Controle, observando que:
2.1. O teletrabalho deve ser exercido em condições de qualidade de vida e de saúde do trabalhador, abrangendo não só a ausência de doenças, mas também os elementos físicos e mentais que afetam a saúde e estão diretamente relacionados com a segurança e a higiene do trabalho;
2.2. O teletrabalho exige necessariamente adaptação e treinamento, incluindo treinamento mínimo para o teletrabalho para fins de qualificação e motivação das pessoas, de forma a que sejam atingidos níveis adequados de segurança e higiene;
2.3. O teletrabalho exige comunicação e cooperação em toda a rede na qual se insere, seja no âmbito das equipes, dos grupos de trabalho, das chefias e de todos os demais níveis, inclusive o direito de o trabalhador ser informado periodicamente sobre o resultado do seu trabalho, atividades a desempenhar, e outras questões objetivas;
- OBSERVAR os parâmetros da ergonomia, seja quanto às condições físicas ou cognitivas de trabalho (por exemplo, mobiliário e equipamentos de trabalho, postura física, conexão à rede, design das plataformas de trabalho online), quanto à organização do trabalho (o conteúdo das tarefas, as exigências de tempo, ritmo da atividade), e quanto às relações interpessoais no ambiente de trabalho (formatação das reuniões, transmissão das tarefas a ser executadas, feedback dos trabalhos executados), oferecendo ou reembolsando os bens necessários ao atendimento dos referidos parâmetros, nos termos da lei, bem como limitações, procedimentos e determinações dos Órgãos de Controle, tais como Tribunais de Contas no caso da Administração Pública.
- GARANTIR ao trabalhador em teletrabalho e em especial no telemarketing, a aplicação da NR 17, anexo II, prevendo-se períodos e procedimentos adequados de capacitação e adaptação, para introdução de novos métodos ou dispositivos tecnológicos que traga alterações sobre os modos operatórios dos trabalhadores, a garantia de pausas e intervalos para descanso, repouso e alimentação, de forma a impedir sobrecarga psíquica, muscular estática de pescoço, ombro, dorso e membros superiores; com a devida adequação da equipe às demandas da produção, de forma a impedir sobrecarga habitual ao trabalhador.
- OFERECER apoio tecnológico, orientação técnica e capacitação às trabalhadoras e aos trabalhadores para realização dos trabalhos de forma remota e em plataformas virtuais, nos termos da Convenção 142 da OIT e art. 205 da Constituição da República.
- INSTRUIR os empregados, de maneira expressa, clara e objetiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças, físicas e mentais e acidentes de trabalho, bem como adotar medidas de segurança como intervalos e exercícios laborais.
- OBSERVAR a jornada contratual na adequação das atividades na modalidade de teletrabalho e em plataformas virtuais, com a compatibilização das necessidades empresariais e das trabalhadoras e trabalhadores responsabilidades familiares(pessoas dependentes sob seus cuidados) na elaboração das escalas laborais que possam acomodar as necessidades da vida familiar, especialmente nutrizes, incluindo flexibilidade especial para trocas de horário e utilização das pausas
- ADOTAR modelos de etiqueta digital em que se oriente toda a equipe, com especificação de horários para atendimento virtual da demanda, assegurando os repousos legais e o direito à desconexão, bem como medidas que evitem a intimidação sistemática (Bullying) no ambiente de trabalho, seja verbal, moral, sexual, social, psicológica, físico, material e virtual, que podem se caracterizar por insultos pessoais, comentários sistemáticos e apelidos pejorativos, ameaças por quais meios, expressões preconceituosas, pilhérias, memes.
- GARANTIR o respeito ao direito de imagem e à privacidade das trabalhadoras e trabalhadores, seja por meio da orientação da realização do serviço de forma menos invasiva a esses direitos fundamentais, oferecendo a realização da prestação de serviços preferencialmente por meio de plataformas informáticas privadas, avatares, imagens padronizadas ou por modelos de transmissão online.
- ASSEGURAR que o uso de imagem e voz, seja feito somente com consentimento expresso das trabalhadoras e trabalhadores, principalmente quando se trata de produção de atividades a ser divulgado em plataformas digitais abertas em que seja utilizado dados pessoais (imagem, voz, nome) ou material produzido pelo profissional.
- GARANTIR a observação de prazo específicos e restritos ao período das medidas de contenção da pandemia da COVID-19 para uso do material produzido pelos trabalhadores e trabalhadoras, quando tiver havido alteração da forma de prestação contratual por força daquelas medidas.
- GARANTIR o exercício da liberdade de expressão da trabalhadora ou trabalhador, ressalvadas ofensas que caracterizem calúnia, injúria e difamação;
- ESTABELECER política de autocuidado para identificação de sinais e sintomas de COVID-19, com garantia de posterior isolamento e contato dos serviços de saúde na identificação de casos suspeitos.
- GARANTIR que o teletrabalho conforme o Estatuto do Idoso seja oferecido ao idoso sempre de forma a favorecer a sua liberdade e direito ao exercício de atividade profissional, respeitadas suas condições físicas, intelectuais e psíquicas.
- ASSEGURAR que o teletrabalho favoreça às pessoas com deficiência, obtenção e conservação do emprego e progressão na carreira, com reintegração da pessoa na sociedade, garantindo-se acessibilidade, adaptação e desenho universal, conforme lei.
- ADOTAR mecanismo de controle da jornada de trabalho da trabalhadora ou trabalhador para o uso de plataformas digitais privadas ou abertas na realização de atividade capacitação, a qual é incompatível com medidas de redução da jornada de trabalho ou de suspensão do trabalho, nos termos da Medida Provisória n. 936/2020.
- ESTIMULAR a criação de programas de profissionalização especializada para a mão de obra dispensada, podendo contar com apoio do poder público, para o caso de a automação e a automatização das atividades resultar em eliminação ou substituição significativa da mão de obra.
Mulheres são maioria, negros e sem casa própria são minoria
Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE, 8,4 milhões estavam trabalhando na modalidade home office, o que representa 10% dos trabalhadores ocupados no país, 81,4 milhões. As mulheres representam a maior parte, cerca de 56%. A desigualdade fica clara, quando se nota a diferença racial. Apenas 34% dos que trabalham em casa são negros. O restante, 66%, são não negros (brancos, amarelos, indígenas). Mas a desigualdade fica mais gritante ao observar os dados que refletem a realidade de muitos trabalhadores e trabalhadoras. Cerca de 28% não possuem casa própria, contra 72% do que tem escritura da residência. Vale ressaltar que os dados foram divulgados em julho. Pesquisa mais recente do PNAD revela queda no número de trabalhadores que estão na modalidade Home Office. A modalidade de trabalho remoto acabou por se tornar mais um indicativo de desigualdade, visto que trabalhar em casa, acaba por se tornar um privilégio que poucos possuem.
Confira na íntegra a nota divulgada pelo Ministério Público do Trabalho > https://mpt.mp.br/pgt/noticias/nota-tecnica-n-17-sobre-trabalho-remoto-gt-covid-19-e-gt-nanotecnologia-2.pdf